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27/05/2012 / Paulo Wainberg

Mundo caído

Foi num domingo de manhã que seu mundo caiu.

Oito e meia, todos dormindo em casa.

Preparou o café, como sempre fazia, com esmero e cuidado. Era uma prazer do qual não abria mão, preparar seu café da manhã de domingo, sentar sozinho na mesa da cozinha e ler o jornal, com calma e sem a sensação de urgência dos outros dias da semana.

Tinha tudo planejado, depois do café, que gostava preto, da fatia de pão com geléia de uva e da leitura do jornal, ia de volta para a cama, dormir o sono matinal que tão bem lhe fazia, aos domingos.

O café quentinho na xícara, o jornal aberto a sua frente, estendeu a mão para pegar o adoçante líquido, sem o qual não ingeria café.

Lendo as primeiras matérias do jornal, virou o líquido sobre o café e… nada. Estava vazio. Tinha terminado o adoçante!

Perplexidade? Pânico? Raiva? Não sabia definir o que estava sentindo, não sabia mesmo. Desesperado, abriu gavetas e armários a esmo, em busca de adoçante, nem que fosse em pó. Nada. Cogitou de açucar, tomar café com açucar era o que não fazia há anos.

Também não tinha açucar.

Caminhou de um lado para o outro, perdido no paradoxo daquele domingo de manhã que, de tão agradável prognóstico se transformara em terrível pesadelo.

O que fazer, agora? Como sair daquela emboscada? O jornal, há pouco acolhedor passatempo, lançava chamas. O café, há pouco quentinho e fumegante, jazia como mancha negra de filme de terror, olho gigantesco prometendo afogá-lo.

Na derradeira esperança, apertou com todas as forças o recipiente do adoçante, na esperança de uma solitária gota a pingar-lhe o café, o que, apesar de tudo, recoloraria o Universo no seu lugar.

Nada, nem umidade apareceu na boquilha afunilada do objeto dentro do qual jazeu o adoçante. Como era o nome daquilo, mesmo? Como se chama essa garrafinha de plástico onde os adoçantes líquidos são postos? Vazinho? Adoçantereptor? Supositório de adoçante?

Maldição!

Desamparado, deu-se por vencido. Nada havia a fazer, seu mundo caira, nada recuperaria os momentos perdidos.

Desconsolado, foi para a cama e voltou a dormir, na esperança de que, ao acordar, alguém da casa já tivesse comprado adoçante.

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